Breve introdução
Autor: Wagner França
No final do primeiro período
filosófico de Nietzsche, o filosofo alemão entra em contato com alguns
pensadores franceses: os assim chamados moralistas franceses por intermédio de
seu amigo Paul Rée. Tais pensadores, sobretudo do século XVII e XVIII, possuem
uma maneira distinta tanto em pensar o homem, como possuem uma forma peculiar
de escrita; dada quase sempre em máximas, sentenças aforismos. Os moralistas
franceses caracterizam-se por serem os “primeiros psicólogos” ou os “psicólogos
franceses”, como são comumente chamados. Um dos fatores que pode ter atraído a
atenção de Nietzsche foi a maneira como os moralistas entendem o homem.
Sua preocupação não reside na busca por uma verdade ontológica ou algum sistema
fechado conceitualmente, muito menos em prescrever normas morais ou imperativos
éticos de qualquer natureza. Os moralistas estudam o homem por ele mesmo; é
aquele que se põe a margem da sociedade para se tornar espectador dos outros e
dele mesmo, e assim podendo pintar os seus retratos. Na França do século XVII
era comum descrever os atos de uma pessoa ou sociedade através da
“pintura de retratos”, que nada mais são que a descrição de um caráter. A
partir desse momento quando é fortemente influenciado pelos moralistas
franceses, Nietzsche muda drasticamente o seu modo de pensar desde então, assim
como sua escrita, pois seus primeiros escritos possuem a forma de discurso
contínuo, como por exemplo nas obras: O Nascimento da Tragédia; A
Filosofia na idade trágica dos Gregos e nas Considerações
Extemporâneas, Nietzsche ainda não usa de forma plena sua mais famosa forma
de escrita; o aforismo. O filosofo influenciado em decorrência de tais
leituras, em sua obra seguinte altera o modo como escreve, dada em aforismos, e
ainda mostra mais claramente a influência no titulo da obra: Humano,
Demasiado humano.
Em O Andarilho e
sua Sombra, na sessão 214, da obra Humano,
Demasiado Humano II, ele afirmou: “ao ler Montaigne, La Rochefoucauld, La
Bruyère, Fontenelle (sobretudo o Dilogue des morts), Vauvenargues,
Chanfort, estamos mais próximos da Antiguidade do que com qualquer grupo de
seis autores de outros povos.”[1]
Nietzsche, segundo tal afirmação, aproxima os moralistas dos antigos gregos (pre-socráticos) no sentido de bem serem lidos e compreendidos, pois tanto a escrita como o foco de seu pensamento possuem as mesmas características. Entretanto um desses moralistas se destaca mais no gosto de Nietzsche, a saber: La Rochefoucauld.
Nietzsche, segundo tal afirmação, aproxima os moralistas dos antigos gregos (pre-socráticos) no sentido de bem serem lidos e compreendidos, pois tanto a escrita como o foco de seu pensamento possuem as mesmas características. Entretanto um desses moralistas se destaca mais no gosto de Nietzsche, a saber: La Rochefoucauld.
Talvez o mais célebre
dentre os moralistas franceses seja François, Duque de La Rochefoucauld (1613-1680).
Sua obra, Máximas e Reflexões, publicada anonimamente na
Holanda em 1665; logo na epígrafe uma crítica às virtudes, “Não
são nossas virtudes, muitas vezes, mais que vícios disfarçados.”. Esse é o
foco principal da obra do moralista, onde através de varias máximas e sentenças
morais mostrará os mecanismos de nossas ações. As virtudes, para o pensador
francês não passam de puro egoísmo e falsidade. A sua obra tem como principal
tema a denúncia do amor-próprio e das falsas virtudes. O moralista atribui ao
amor-próprio um papel dominante na motivação das ações humanas, e entende o
amor-próprio como extremamente interesseiro e egoísta, tal característica
atribuída ao amor-próprio revela que, mesmo nossas melhores ações, aquelas
ditas como altruístas, as atitudes que aparentam uma compaixão e caridade, são
no fundo, apenas ações que visam a uma adulação - um lucro. O pensamento de La
Rochefoucauld, em relação à moral remete a esta temática, mesmo uma ação dita
como correta e boa, está necessariamente ligada a uma concepção egoísta e
falsa. Todavia, para o autor das máximas, é necessária tal
falsidade, pois somente assim o homem pode receber e realizar “boas” ações.
Nota-se na sentença 182 essa perspectiva, onde o pensador afirma: “entram os
vícios na composição das virtudes tanto quanto os venenos na composição dos
remédios: é a prudência que os ajunta e tempera, utilmente empregando-os contra
os males da vida.” La Rochefoucauld inaugura uma era de
desconfiança sobre a moral. Para ele, nenhuma moral seja ela tanto teleológica
quanto deontológica irá de forma alguma romper com o caráter falso e egoísta do
homem.
Evidente é a crítica realizada
pelo pensador francês acerca da moral, que quase duzentos anos depois se
desdobrará no pensamento refinado de Nietzsche, sobretudo no tocante a moral,
pois ambos possuem de certa forma, uma concepção que remete a uma moral
instintiva e nada racional. A influência abrange também a questão psicológica
existente em Nietzsche deve em grande parte as alegações feitas por La
Rochefoucauld ao longo de seus escritos, bem como sua refinada capacidade em
perceber os elementos por traz de nossos atos.
Em suma, neste breve texto foi apresentado de modo extremamente breve
uma maneira de demonstrar a influência dos moralistas franceses, em especial La
Rochefoucauld no pensamento de Nietzsche.
[1] NIETZSCHE, Friedrich. Humano, Demasiado Humano: Um Livro para Espíritos Livres (vol. II) p.259-260.
A imagem:
Retrato do moralista francês François VI, duc de la Rochefoucauld.