sábado, 24 de setembro de 2011

Aforismo 109 - Sofrimento é conhecimento


Neste aforismo Nietzsche aborda a troca das afirmações dos sacerdotes, a afirmação de Deus, pela verdade. "A tragédia é que não podemos acreditar nesses dogmas da religião e da metafísica, quando trazemos no coração e na cabeça o rigoroso método da verdade, e que por outro lado, graças a evolução da humanidade, tornamo-nos tão delicados, suscetíveis e sofredores a ponto de precisar de meios de cura e de consolo da mais alta espécie; daí surge o perigo de o homem se esvair em sangue ao conhecer a verdade."
Há um certo pessimismo exposto, onde sem dores não se pode avançar nem crescer, e existe um rigoroso método de verdade como busca da verdade, mas as dores de se conhecer a verdade são como dores do parto, onde a verdade é terrível.

Nietzsche cita versos de Lord Byron, um poeta romântico que transfigura através da arte sua melancolia, embora seja Nietzsche crítico do romantismo, pois Lord Byron para ele era anti-romântico, era visto como sábio. Até mesmo Nietzsche usa o mesmo título do poeta neste aforismo, onde sofrimento está no sentido de aflição.
"Sofrimento é conhecimento: aqueles que mais sabem
Devem prantear mais profundamente a verdade fatal,
A árvore do conhecimento não é a da vida."

Aqui a "verdade fatal" é vista como pessimismo, e "a árvore do conhecimento não é a da vida" está relacionada ao livro Gênesis (Cap. 3, versículo 23 a 24), onde a árvore da vida tinha sido guardada no Jardim do Éden. Querer o conhecimento pode ser algo contrário a vida, cria um certo ceticismo, até mesmo um certo niilismo.

"Mas certamente a frivolidade ou a melancolia , em qualquer grau, é melhor do que a meia-volta ou deserção romântica (...)."
Aqui a tradução de "leichtsinn" do alemão como "frivolidade", pode ser melhor trocada pela tradução "leviandade", com um lado mais positivo de levar a vida, de um espírito livre, embora Nietzsche traz em Humano, Demasiado Humano um espírito livre ainda tenso. E aborda também a "consciência intelectual", como um jogo, um equilíbrio entre leviandade e melancolia para não cair no romantismo.

Questão: Nietzsche pode estar preocupado em não ter um "consolo"?

No fundo Nietzsche quer um consolo, mas ele cria espíritos livres. A ética em Humano, Demasiado Humano é gozar as coisas mais práticas.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Capítulo 3 – Aforismo 108 – A dupla luta contra o infortúnio



No livro Além de Bem e de Mal Nietzsche aborda temas semelhantes a estes escritos no capítulo 3, porem com mais radicalidade.

No aforismo 108 Nietzsche opera com três períodos: Religião, Política e Arte.
“A religião e a arte (e também a filosofia metafísica) se esforçam em produzir a mudança da sensibilidade, em parte alterando o juizo sobre os acontecimentos (por exemplo, com ajuda da frase: ‘Deus castiga a quem ama’), em parte despertando prazer na dor, na emoção mesma (ponto de partida da arte trágica).”

Na frase “Deus castiga a quem ama” aborda como as religiões têm efeito narcótico, de auto-hipnose, efeito sobre as causas. Religião e arte para Nietzsche têm efeitos que não diminuem as causas. “(...) o alívio e a anestesia momentâneos (...)”. A religião tem como função amenizar as dores humanas e não atua como verdade. Vemos também uma crítica a Shopenhauer, o qual tem uma visão positiva das religiões, religião é vista por ele como uma necessidade metafísica, e Nietzsche luta contra isso, pois vê a religião apenas como atestado de nossa fraqueza, uma unidade de tudo o que vive e sofre.

“Quanto mais diminuir o império das religiões e todas as artes da narcose, tanto mais os homens se preocuparão em realmente eliminar os males (...).” Alem da religião, a arte é vista aqui com um sentido amplo, os artistas são artistas da narcose.
Vemos neste aforismo a tragédia como centro no jovem Nietzsche, na tragédia temos a arte de transfigurar prazer em dor e dor em prazer.

“(...) pois há cada vez menos matéria para a tragédia, já que o reino do destino inexorável e invencível cada vez mais se estreita (...).” O mundo moderno tem um “bisturi” de danificação psicológica, tem espírito doloroso, de ferir a si mesmo.
Vemos aqui que Nietzsche quer “acertar contas” com a religião, então faz uma crítica direta e metódica a ela.

Questão: Como Nietzsche se coloca em relação a metafísica?

Nietzsche é anti-metafísico. Em Aurora a questão da metafísica fica mais insinuada. Por exemplo, Nietzsche não usa conceitos metafísicos, em Humano Demasiado Humano fica mais cuidadoso com a palavra “essência”, prefere utilizar “vida religiosa”. Existe um empirismo moral, opera com prazer e dor no campo empírico, aborda o espírito livre, tem a perspectiva de se livrar plenamente da metafísica.

Imagem: The Sacrifice of Isaac datada de 1590 á 1610 - Michelangelo Merisi da Caravaggio