segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Aforismo 148 – Os poetas tornando a vida mais leve

“Na medida em que também querem aliviar a vida dos homens, os poetas desviam o olhar do árduo presente, ou com uma luz que fazem irradiar do passado, proporcionam novas cores ao presente.”
A ligação com o passado pode ter o aspecto negativo de desligamento com o presente, o artista cria uma certa espécie de ópio que não ajuda a transformar a realidade.

Aforismo 147 – A arte conjurando os mortos

“A arte exerce secundariamente a função de conservar, e mesmo recolorir um pouco, representações apagadas, empalidecidas...”
Então, o primeiro papel da arte é abstrair-se da realidade, e o segundo como trata neste aforismo, é, ao contrário de Wagner, que mexia com o presente e tentava modificá-lo, voltar e “mexer” com o passado, fazendo reanimar algo que fora esquecido.“Por causa desse benefício geral da arte devemos perdoar o próprio artista, se ele não figura nas primeiras filas da ilustração e da progressiva virilização da humanidade...”
Aqui, se não houvesse o benefício geral, o artista não seria perdoado, ele somente está justificado por causar alguma coisa nas pessoas.

Aforismo 146 – O senso da verdade no artista


Neste aforismo é importante destacar que além da defesa da tese do vir-a-ser, Nietzsche defende outra importante tese para ele, em que o artista é superior a verdade.
“...considera o prosseguimento de seu modo de criar mais importante que a devoção científica à verdade em qualquer forma, por mais simples que ela se manifeste.”

O artista é considerado aquele ser que abstrai-se da realidade, e a partir disto, a ela, é dado um novo sentido.

Capítulo 4 - Aforismo 145 - O que é perfeito não teria vindo a ser



Aquilo que constituía a essência de uma obra de arte, seu ser, não é estabelecido repentina e instantaneamente.
No caso da música, por exemplo, muitos compositores levam anos para compor de devido modo. Assim são as obras de arte para Nietzsche, que são compostas por um acúmulo, um processo, e não por uma mágica ou um deus que faz brotar a perfeição do chão.“Diante de tudo o que é perfeito, estamos acostumados a omitir a questão do vir a ser...”
Nietzsche defende a tese de Heráclito, que é colocada também em Ecce Homo, da questão do vir-a-ser, do mundo em permanente movimento. Antes, na metafísica de artista, o artista, como no caso do músico, penetra em uma esfera que pré-existe e faz sua composição. Aqui é abandonada a metafísica.

“Está fora de dúvida que a ciência da arte deve se opor firmemente a essa ilusão e apontar as falsas conclusões e maus costumes do intelecto, que os fazem cair nas malhas do artista.”
Podemos observar aqui que não há a ciência contra a arte, mas a “ciência da arte”, não há um contraposto entre as duas. E, mesmo Nietzsche estando mais próximo da ciência, não abandona a arte. Aqui, na expressão “maus costumes do intelecto”, pode ser visto como o intelecto que vive com determinados conceitos deixa de apreender muitos aspectos da realidade.

sábado, 8 de outubro de 2011

Aforismo 141

Até então Nietzsche trata do cristianismo, o qual, para ele, é baseado numa psicologia falsa, do sentimento de culpa. Para o cristianismo os santos são de poderes, fazem milagres; para os antigos tudo isso é inexplicado. Pouco antes deste aforismo, Nietzcshe fala do santo e do asceta, sobre o domínio; eles dominam a natureza interior, ocorrendo uma tirania do seu próprio ser, que no fundo visa o domínio de si mesmo; para Nietzsche o santo tem um espírito forte. Não critica o budismo, por eles terem uma natureza mais tranquila; o santo é mais selvagem, é ambicioso (unir-se a Deus); o asceta nutre vingança e raiva e querem descarregar.

No cristianismo o pecado grave pode levar ao inferno, mas a misericórdia traz a salvação. Nietzsche não leva a sério, diz ser falso, uma crença errada. E hoje somos inocentes a isso, o sentimento de culpa é que faz sentido.
Nietzsche critica a epidemia de viver; e surge o interesse pelo asceta. Santos e ascetas com este domínio de si, são capazes de dominar os outros.
"Sabe-se que a fantasia sensual é moderada ou quase suprimida pela regularidade das relações sexuais, e inversamente se torna desenfreada e dissoluta com a abstinência ou a desordem nessas relações."
Aqui Nietzsche trata a fantasia da relação sexual como desenfreada, vê como uma sublimação, que se for canalisada pode ser usada para a criação de outras coisas.
"O olhar do santo, dirigido ao significado, terrível em todo o aspecto, da breve existência terrena, à proximidade da decisão final sobre infinitos espaços de nossas vidas, esse olhar em brasa, num corpo semi-aniquilado, fazia tremer os homens antigos em todas as profundezas; olhar, desviar o olhar com horror, de novo sentir o encanto do espetáculo, abandonar-se a ele, saciar-se com ele até a alma estremecer com ardor e calafrio - este foi o último prazer que a Antiguidade inventou, após ter se tornado insensível até mesmo à visão das lutas entre homens e animais."
Nietzsche trata o prazer que nasce do próprio mundo antigo, o último prazer que a Antiguidade inventou foi o olhar do santo, que nasceram com anseios de domínio.
Questão: Nietzsche já quer trazer a vontade de poder para o controle de si?
Aqui ainda não, a partir de Aurora fica mais explícito. No fundo Nietzsche tem um fascínio, uma ideia apenas.

Aforismo 133

Neste aforismo Nietzsche aborda criticamente os juizos humanos, as obras perfeitas da imaginação do homem. Critica Schopenhauer, o qual acreditava que a ação altruista é uma auto-fruição, e Nietzsche não acredita na existência de ações altruistas."Jamais um homem fez algo apenas para outros e sem qualquer motivo pessoal; e como poderia mesmo fazer algo que fosse sem referência a ele, ou seja, sem uma necessidade interna (que sempre teria seu fundamento numa necessidade pessoal)? Como poderia o ego agir sem ego?"

Lichtenberg e La Rochefoucauld são citados, Lichtenberg diz que sente pelo outro e que coloca-se no lugar do outro, e La Rochefoucauld diz ser por amor a nós mesmos; e para Nietzsche isso é altruismo.
"Se um homem desejasse ser todo amor como aquele Deus, fazer e querer tudo para os outros e nada para si, tal já seria impossível porque ele teria de fazer muitíssimo para si mesmo, a fim de poder fazer algo pelos outros. Depois pressupõe que o outro seja egoista o bastante para sempre aceitar este sacrifício..."Nietzsche defende a ideia de que para haver o altruista, necessariamente precisa-se de um egoista, e se todos fossem altruistas não existiria compaixão.
"...a ideia de um deus inquieta e humilha, enquanto nele se crê, mas no estágio atual da ciência etnológica, não há mais dúvida quanto a sua gênese..."
Coloca-se Deus no superior para ter poder no ser humano, Ele faz o que é bom, e o cristianismo precisa disso, o homem é o pecador e o rebaixado. Podemos pegar como semelhante o exemplo de Dom Quixote, que salva gigantes e donzelas; Servantes coloca contraposições com a baixeza do século XVII, há um distanciamento do real e do imaginário.

"Acabando a ideia de Deus, acaba também o sentimento do 'pecado'..."Aqui "pecado" no sentido irônico. Nietzsche teve experiência de sentir-se culpado pelo pecado, ele não aborda de algo que seja distante a ele.
No final é visto que se tudo é necessário (todas as ações), então o homem é um completo irresponsável.

domingo, 2 de outubro de 2011

Aforismo 130 - Sobrevivência do culto religioso no coração

"...a atmosfera de uma arquitetura que, sendo a habitação de uma divindade, se estende até o indefinido, e em todos os espaços escuros faz temer a presença dessa divindade (...) Os resultados de tudo isso não estão perdidos, todavia: o mundo interior dos estados de espíritos sublimes, comovidos, plenos de pressentimentos, profundamente contitos, ditosos de esperança, tornou-se inato aos homens através do culto, especialmente, o que dele existe agora na alma foi largamente cultivado quando o culto brotava, cerscia e florescia."
Aqui, ainda na abordagem da religião, vemos que Nietzsche faz a observação de que mesmo na transição da religião ela ainda continua vivendo no estado sublime, que o excesso de religiosidade mesmo em transição sobrevive.

Aforismo 126 - Arte e força da falsa interpretação



"-Todas as visões, terrores, esgotamentos e êxtases do santo são estados patológicos conhecidos, que ele, a partir de arraigados erros religiosos e psicológicos, apenas interpreta de modo totalmente diverso, isto é, não como doença." (...) Entre as maiores realizações daqueles que chamamos de gênios e santos se inclui a de conquistar intérpretes que os compreendem mal para o bem da humanidade."
Nesta época exercia-se a psicologia experimental (materialista), uma época positivista ciencificista; vemos este aforismo como complemento do aforismo 111 que Nietzsche tem uma visão seca da religiosidade, identificando-a como afetamento de uma doença no homem.

sábado, 1 de outubro de 2011

Aforismo 111 - Origem do culto religioso


Neste aforismo Nietzsche sonda a imaginação dos homens religiosos, surge o problema se a natureza é ausência de regras e como relacionar-se com a natureza. A religião surge como explicação para relacionar estes mundos, ter um certo domínio da natureza (para favorecimento dos interesses humanos), como necessidade de impor uma lei a natureza, neste aspecto a religião tem um caráter autoritarista.
"Se retornarmos aos tempos em que a vida religiosa florescia com toda força, acharemos uma convicção fundamental que já não partilhamos, e devido à qual vemos fechadas definitivamente para nós as portas da vida religiosa: tal convicção diz respeito à natureza e a relação com ela."
O homem inverte essa relação e o homem é a medida dessas relações.

"Naqueles tempos nada se sabia sobre as leis da natureza; seja na terrra, seja no céu, nadatinha que suceder; uma estação, o sol, a chuva podiam vir ou faltar. Não havia qualquer noção de causalidade natural."
Nietzsche cita exemplos das arbitrariedades, qualquer situação é uma força mágica no mundo homérico dos gregos. Ele faz uma transição, uma linha histórica dos gregos ao cristianismo.

"Nós homens modernos, sentimos precisamente o inverso: quanto mais interiormente rico o homem se sente hoje, quanto mais polifônica a sua subjetividade, tanto mais poderosamente age sobre ele o equilíbrio da natureza; juntamente com Goethe, todos nós reconhecemos na natureza o grande meio da tranquilização da alma moderna (...)"
Aqui vemos que é separado os tempos da religião e o tempo de Nietzsche (tempos modernos), demarca bem que o mundo da religião é o mundo passado e temos um grande avanço com esse saber. Nietzsche cita Goethe que está descobrindo as leis da natureza e faz uma crítica a modernidade, pois podemos considerar Nietzsche como um anti-capitalista romântico e está alheio a isso, prefere uma vida com ócio criativo.

"O sentido do culto religioso é influenciar e esconjurar a natureza em benefício do homem, ou seja, imprimir-lhe uma regularidade que a princípio ela não tem; enquanto na época atual queremos conhecer as regras da natureza para nos adaptarmos a ela."
Vemos que a religião exerce coações (magia - prejudicar o espírito) com as forças da natureza, e parece que Nietzsche acredita que a ciência faça isso melhor, ele está num certo otimismo com a ciência, mas como algo provisório neste contexto. Defende mais tarde que a relação com os deuses é pessoal e que pode-se também abandonar os deuses, faz uma descarga de sentimentos nos primórdios da religião; fala também que a crença foi invadida e o cristianismo fez isso em excesso, trabalha o santo e o asceta passando pelos gregos, por enquanto aqui os deuses olímpicos estão mais próximos.



Imagem: "Sownstorm" datado em 1842 - Joseph Mallord William Turner