Reunião do dia 22 de Junho de 2012
Aforismo 429 – A nova paixão
Tema que já foi tratado no aforismo 424, aqui Nietzsche vai tornar a
falar acerca da paixão pelo conhecimento, pontuando da seguinte maneira:
"Porque tememos e odiamos um possível retorno à barbárie? Porque
ela tornaria os homens mais infelizes do que são? Ah, não! Em todos os tempos
os bárbaros tiveram mais felicidade, não nos enganemos.".
Traço marcante de nosso filósofo é ir contra a legitimação de uma linha
de pensamento vigente, trazendo de forma ácida e muito bem colocada um ponto de
vista que até então não havia sido expressado. Voltando-se para as bases do
problema, buscando entender a semente que gerou o fruto “ruim”, Nietzsche
questiona o que não haviam questionado até então, faz perguntas que não haviam
feito anteriormente e se posiciona de maneira nova (para sua época) e
intrigante.
No decorrer do debate conseguimos formar duas interpretações diferentes
para o que Nietzsche está nos trazendo, porém, um ponto em comum nas duas
análises é de que existe uma forte tensão entre a barbárie e a paixão do
conhecimento, isso fica claro no decorrer da leitura, portanto, ambos os
raciocínios partem desse princípio em comum. Buscaremos expor as duas
interpretações no decorrer deste resumo.
Um dos pontos mais importantes e divergentes do debate foi à questão da
barbárie, para ela possuímos duas análises, uma tomando a barbárie em um
sentido histórico e outro como imagem.
"Mas nosso impulso ao conhecimento é demasiado forte para que ainda
possamos estimar a felicidade sem conhecimento, ou a felicidade de uma forte e
firme ilusão; apenas imaginar esse estado é doloroso para nós!".
Uma das interpretações possíveis para tal colocação é a de que os
bárbaros não eram dotados dessa paixão pelo conhecimento, ou seja, repousavam
sobre uma “forte e firme ilusão” acerca da felicidade, logo, afastavam
questionamentos desconfortáveis, questionamentos estes que surgiam através da
paixão pelo conhecimento. Levando em conta que tal interpretação visa à análise
do que seria “o bárbaro” em um sentido histórico.
Já a segunda interpretação enxerga “o bárbaro” como uma imagem, ou seja,
a imagem de uma barbárie enquanto um tempo em que os ânimos se encontram mais inflados,
justamente pela ilusão já narrada, e não necessariamente em um sentido
histórico. Vale pontuar que sempre existiu uma tensão entre o aquecimento e o
esfriamento dessa tensão, o aquecimento excessivo gera um problema assim como o
esfriamento em demasia.
Ambas as interpretações concordam que a paixão pelo conhecimento estaria
vinculada com o Iluminismo.
Outro ponto onde encontramos duas interpretações se dá com a seguinte
passagem:
"Sim, odiamos a barbárie – preferimos todos o fim da humanidade ao retrocesso do
conhecimento! E, afinal: se a humanidade não perecer de uma paixão, perecerá de
uma fraqueza: o que é preferível? Eis a questão principal. Queremos para ela um
final em luz ou em areia? – ".
A primeira interpretação afirma que o perecimento através da luz seria
consequência da paixão do conhecimento, uma vez que ela resultaria na implosão
da figura de Deus, gerando uma sensação de vazio dentro do ser humano. Vale
lembrar que futuramente Nietzsche trará a morte de Deus de forma mais concreta
em suas obras. Já o perecimento em areia seria, no caso, a fraqueza do homem em
não enfrentar tal ilusão e seguir adiante com essa paixão pelo conhecimento, o
que leva a crer que o ser humano não tem o poder de dominar ou manipular suas
paixões (novamente percebe-se aqui um possível diálogo com os moralistas
franceses).
Para a segunda interpretação fica nítido o pessimismo nas palavras de
Nietzsche, uma vez ele deixar claro que a humanidade pereça de uma forma ou de
outra, o que parece bater de frente com a proposta de Aurora, levando em conta que se
espera um novo tempo, novas auroras, no entanto enxerga o perecimento
inevitável. A divergência com a primeira interpretação se mostra também com
relação paixão/fraqueza. Que fraqueza seria essa se não uma paixão? Uma vez
sendo o conhecimento a nova paixão.
Finalizo o resumo desse aforismo com outras duas passagens:
"A inquietude de descobrir e solucionar tornou-se tão atraente e
imprescindível para nós como o amor infeliz para aquele que ama: o qual ele não
trocaria jamais pelo estado de indiferença; – sim, talvez nós também sejamos
amantes infelizes! O conhecimento em nós transformou-se em paixão que não
vacila ante nenhum sacrifício e nada teme, no fundo, senão a sua
própria extinção.".
"E talvez até a humanidade pereça devido a essa paixão do
conhecimento! – mas
nem este pensamento influi sobre nós! O cristianismo se atemorizou alguma vez
ante um pensamento assim? Não são irmãos o amor e a morte?"
Vale ressaltar que Nietzsche fala muito em nós, "nosso impulso ao conhecimento", porém é importante colocar que essa é a paixão do conhecimento dos espíritos livres.